“Eu vejo o futuro repetir o passado”? Talvez, ou nem tanto. O primeiro ano do terceiro governo Lula criou expectativas, trouxe avanços em algumas áreas, mas também gerou desilusões, especialmente para quem defende a efetivação do direito à comunicação no país. Muitas conquistas coletivas nesse campo, acumuladas em anos de militância, pesquisas e projetos, já haviam sido bombardeadas pelo (des)governo de Bolsonaro. No novo governo Lula, esperava-se refazer caminhos, recuperar perdas e avançar.

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Mas não foi bem assim em 2023 – e não tem sido em 2024. Até agora, a gestão de Lula não priorizou, como deveria, o respeito aos pilares e diretrizes do direito à comunicação. Pelo contrário, como fica evidente na nomeação e permanência de Juscelino Filho, do União Brasil, no Ministério das Comunicações. Na radiodifusão, pior do que não ter avanços, temos retrocessos. Na comunicação pública, nem mesmo o Conselho Curador da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) foi retomado. Políticas de fortalecimento da comunicação popular e comunitária parecem assunto de outros tempos no governo federal.

Não bastassem esses desafios, os coletivos e organizações da sociedade civil ainda enfrentam discursos de ódio e desinformação, que se proliferam com a conivência estratégica das grandes plataformas digitais e a inércia do Congresso Nacional em regular o ambiente digital, deixando o controle da circulação de informações nas mãos das big techs. Grupos vulnerabilizados permanecem à margem de iniciativas significativas de conectividade digital. O punitivismo racista reforçado por tecnologias de reconhecimento facial também ganha espaço em um governo que se afirma progressista. Colonialismo verde, violência de gênero online e ataques a comunicadores(as) continuam na ordem do dia.

Esses e outros assuntos são tratados no relatório Direito à Comunicação no Brasil 2023. Intitulado “Algo de novo sob o sol? Direito à Comunicação no primeiro ano do atual governo Lula”, o documento reúne 14 textos escritos por autoras e autores com atuação nos respectivos temas, a partir de entrevistas, levantamentos e análises. Além de apontar retrocessos e avanços, o relatório apresenta resistências e lutas em curso.

Sim, há algo de novo sob o sol: ao menos, a extrema-direita não está no centro do poder no país; também é possível identificar, ainda que tímidos, alguns avanços sociais e políticos. São fatos. Mas ainda há muito a ser feito. O slogan “União e Reconstrução”, do Governo Federal, parece não incluir as comunicações nas propostas para “reconstruir” a democracia brasileira. Que tal, por exemplo, começar exonerando o ministro das Comunicações? Pegaria bem, também, criar iniciativas robustas para retomar o caráter público da EBC. Ou, ainda, o governo poderia articular forças para estabelecer leis de regulação das plataformas digitais, enfrentando as big techs com seriedade.

Também seria fundamental olhar com atenção para a radiodifusão e para os programas policialescos misóginos, LGBTfóbicos e racistas, além de repensar a política de reconhecimento facial, que hoje se expande no país.

As cobranças devem ser efetivas e sistemáticas – não apenas ao Governo Federal, mas também ao sistema de justiça, aos poderes legislativos, às agências reguladoras e às empresas. Por isso, o relatório traz em sua parte final Recomendações, com indicações elaboradas com base nos textos deste documento, visando fomentar transformações que coloquem o país na trilha da comunicação como um direito humano.

Para acompanhar todos esses temas, você pode começar pelo texto “Discursos e práticas ‘salvacionistas’ sobre as energias limpas reforçam racismo ambiental”, de Alfredo Portugal e Nataly de Queiroz Lima, que aborda o colonialismo climático e seus impactos em grupos vulnerabilizados.

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