O objetivo é que a publicidade se comunique diretamente aos pais, que devem ser os responsáveis pela decisão de compra da família.

Mais de 70 entidades da sociedade civil, entre elas o Intervozes, entregaram manifesto aos deputados da Comissão de Desenvolvimento Econômico, Comércio e Indústria (CDEIC) pedindo o fim da publicidade e da comunicação mercadológica dirigida ao público infantil. O Projeto de Lei nº 5.921/2001, que trata do tema, vai a votação no dia 07/10.

O projeto de lei (PL 5.921/01), do deputado Luis Carlos Hauly (PSDB-PR) propõe, entre outros pontos, a proibição de publicidade para crianças em meios como rádio, televisão e internet no horário compreendido entre 7h00 e 21h00. Além disso, visa impedir a transmissão de comerciais com apresentadores “infantis ou desenhos, que podem atrair a atenção das crianças”.

No dia 30 de setembro, a decisão sobre o projeto foi novamente adiada. Iniciados os debates o deputado José Guimarães (PT/CE) sugeriu uma composição de todos os membros da Comissão, no sentido de incluir no texto do substitutivo sugerido pelo deputado Osório Adriano (DEM/DF) o seguinte parágrafo: É abusiva toda e qualquer publicidade voltada especificamente ao público infantil. Em razão disso, o deputado Capitão Assunção (PSB/ES) manifestou sua concordância com esse parágrafo e comprometeu-se a retirar o ‘Voto em separado’ que havia preparado caso houvesse consenso entre os demais deputados membros da Comissão. No entanto, quando parecia que a composição aconteceria em torno do texto do deputado José Guimarães (PT/CE), o deputado Miguel Correa (PT/MG) manifestou entendimento contrário, por acreditar que a proibição da publicidade dirigida a crianças seria medida extremamente radical.

Há quatro anos trabalhando com o tema da publicidade infantil, o Instituto Alana tomou a frente das mobilizações em favor do PL. Isabella Henriques, coordenadora do Projeto “Criança Consumo”, do Alana, aponta que ainda falta no Brasil praticar o que já está escrito na lei. “A Constituição brasileira proíbe a publicidade voltada para a criança [considerada também constitucionalmente abaixo dos 12 anos de idade]. A criança está protegida”, explica Isabella ao defender a interpretação feita do capítulo voltado para criança e adolescente na carta de 1988.

“Não queremos acabar com um o mercado [em referência à publicidade]. Queremos que a mensagem se dirija para aos adultos”, defende Tamara Gonçalvez, advogada do Instituto. O maior desafio para o Instituto tem sido incluir os empresários na discussão. “Queremos que o mercado entenda que não vai perder, pelo contrário, vai ganhar reconhecimento da sociedade civil”, diz Isabella, ao se referir à mudança de atitude que as empresas podem ter na publicidade. “As regras [para o setor] existem em outros países, países democráticos e capitalistas como a Suécia, Noruega, Austrália”, reforça.

O Código de Defesa o Consumidor (CDC) é outra referência quando se fala do consumo da criança. O artigo 36 do CDC proíbe a publicidade que não deixa claro que é publicidade. Já, o artigo 37 proíbe a publicidade enganosa e abusiva, aqui entendida como a que “se aproveite da deficiência de julgamento e experiência da criança”.

Estudos analisados pelo Alana mostram que “até por volta dos oito anos a criança não consegue entender o que é a publicidade, ela entende de forma literal e não consegue fazer a distinção entre entretenimento e publicidade”. Tamara diz ainda que “a criança não é considerada um ser que sem capacidade de se auto-determinar, mas ela não deveria ser alvo de mensagem publicitária por ser considerada mais fragilizada em relação a este serviço”.

Dados sobre relação da criança com o consumo apontam que, no Brasil, elas influenciam em cerca de 80% das compras feitas da família (dados constam no próprio site e são do TNS/InterScience outubro de 2003). “De fato a família tem que decidir, mas os apelos da publicidade colocam os pais em uma situação difícil de lidar. A influencia na criança é muito grande”, entende Tamara.

Veja abaixo a íntegra do Manifesto.

MANIFESTO

Pelo fim da publicidade e da comunicação mercadológica dirigida ao público infantil
Em defesa dos diretos da infância, da Justiça e da construção de um futuro mais solidário e sustentável para a sociedade brasileira

Organizações e entidades abaixo assinadas reafirmam a importância da proteção da criança frente aos apelos mercadológicos e pedem o fim das mensagens publicitárias dirigidas ao público infantil.

A criança é hipervulnerável. Ainda está em processo de desenvolvimento bio-físico e psíquico. Por isso, não possui a totalidade das habilidades necessárias para o desempenho de uma adequada interpretação crítica dos inúmeros apelos mercadológicos que lhe são especialmente dirigidos.

Consideramos que a publicidade de produtos e serviços dirigidos à criança deveria ser voltada aos seus pais ou responsáveis, estes sim, com condições muito mais favoráveis de análise e discernimento.

Acreditamos que a utilização da criança como meio para a venda de qualquer produto ou serviço constitui prática antiética e abusiva, principalmente quando se sabe que 27 milhões de crianças brasileiras vivem em condição de miséria e dificilmente têm atendidos os desejos despertados pelo marketing.

A publicidade voltada à criança contribui para a disseminação de valores materialistas e para o aumento de problemas sociais como a obesidade infantil, erotização precoce, estresse familiar, violência pela apropriação indevida de produtos caros e alcoolismo precoce.

Nós abaixo-assinados acreditamos que o fim da publicidade dirigida ao público infantil será um marco importante na história de um país que quer honrar suas crianças.

Por tudo isso, pedimos, respeitosamente, aos Exmos. Deputados da Comissão de Desenvolvimento Econômico, Comércio e Indústria (CDEIC) que se comprometam com a infância brasileira e efetivamente promovam o fim da publicidade e da comunicação mercadológica voltada ao público menor de 12 anos de idade.