Intervozes apresenta contribuições sobre a autonomia da EBC
Por Intervozes em
Carta do coletivo foi apresentada durante debate do Conselho Curador da Empresa Brasil de Comunição (EBC) sobre a autonomia da emissora frente ao Governo Federal.
Confira abaixo a íntegra da carta entregue ao Conselho Curador e a direção da EBC.
Por uma EBC forte e efetivamente pública
O Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação vem, por meio desta carta, saudar os cinco anos da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) e o Conselho Curador pela iniciativa desse debate.
Inicialmente, cabe destacar que desde dezembro de 2007 estamos diante de outro patamar no debate da comunicação pública. Passamos a discutir uma realidade. E isso muda substancialmente a história das comunicações no Brasil. Somos declaradamente entusiastas da comunicação pública. Acreditamos que ela representa, antes de tudo, esperança. Esperança de uma comunicação democrática, plural, regional, inovadora, destemida, participativa. E entendemos que essa comunicação constrói, necessariamente, uma sociedade melhor e mais justa.
É neste sentido, e na crença de contribuir para esse projeto, que entendemos oportuno esse debate promovido pelo Conselho Curador e apresentamos algumas reflexões sobre a relação da comunicação pública com o Governo Federal.
Entendemos que o modelo institucional da EBC precisa ser revisto. A forma como foi estruturada e positivada a empresa foi a possível para aquele momento da sua criação. No entanto, esse modelo traz consigo contradições que obstaculizam a realização de uma comunicação de fato pública, principalmente no que diz respeito à autonomia da EBC frente ao Governo Federal.
Um exemplo é a relação direta de subordinação entre a EBC e a Secretaria de Comunicação do Governo Federal (Secom). A Lei 11.652/2008 que constituiu a EBC estabeleceu que o/a diretor/a presidente/a e o/a diretor/a geral devem ser indicados pela Presidência da República, cabendo ainda a Secom a indicação do presidente do Conselho Administrativo da Empresa, que ainda contará com representantes dos Ministérios da Comunicação; Planejamento, Orçamento e Gestão; e o diretor-presidente da empresa. Essa presença e controle do Executivo Federal coloca em xeque a autonomia e independência da empresa pública de comunicação.
Merece também atenção a relação entre a direção da EBC e a gestão da Secom, em especial com a ocupação recente de vários cargos estratégicos da Empresa por ex-integrantes da Secretaria. Esse antecedente profissional em si não é um impeditivo, mas essas relações históricas trazem riscos que precisam ser superados para que a EBC se estruture com a autonomia necessária frente a qualquer governo ou partido. Mais do que isso, uma vez que esta questão não configura-se como algo pessoal, uma alternativa importante é o estabelecimento de mecanismos de indicação dos dirigentes da empresa que não sejam vinculados ao governo, que tenham histórico de atuação na área da comunicação pública, que se privilegie o corpo próprio da empresa e que seja ouvida a sociedade em sua indicação.
Os mecanismos também devem se estender à definição das atividades da EBC. A Lei 11.652/2008 estabelece uma relação clientelista entre a Secom e a EBC, ao colocar como responsabilidade da emissora pública a transmissão de atos e matérias do Governo Federal, entre outros. Assim a empresa criou uma diretoria prestação de serviços, sendo contratada pela Secretaria para manter veículos e elaborar produtos de comunicação para o Governo Federal. Embora possam ser firmados contratos entre as partes, esta prestação de serviços não se constitui de forma autônoma, mas em cumprimento de dever legal. A EBC abriga, assim, canais e veículos de caráter público (TV Brasil, Agência Brasil, emissoras de rádio) e canais e produtos de comunicação de governo (NBR, Voz do Brasil, Café com a Presidenta, Bom dia Ministro).
Nos parece grave a contradição criada pela união de duas figuras jurídicas e dois objetivos distintos em um mesmo organismo que se estabelece com dupla missão institucional: liderar a comunicação pública no país e produzir a comunicação estatal. Entendemos como que essas características são inconciliáveis e sendo importante a separação estrutural das duas atividades.
Participação da sociedade
O Conselho Curador, que deveria ser um mecanismo de proteção contra influências indevidas, tem avançado, mas ainda possui um problema estrutural. A indicação dos membros da sociedade civi no Conselho são indicados tradicionalmente pelo Presidente da República, mesmo após a realização de consulta pública, criando mais uma instância de subordinação (mesmo que não direta) no espaço que deve ser o principal guardião do caráter público da empresa. Desde antes da criação da EBC, o Intervozes defende um outro modelo de indicação, calcado na eleição por representações da sociedade, afirmando o histórico de participação dentro dos conselhos e organismos de políticas públicas federais. É preciso repensar a forma de indicação e eleição de novos conselheiros, não permitindo o filtro que possa ser realizado pelo Governo.
Ainda na esfera da gestão, não há autonomia sem uma constante participação. O próprio Conselho Curador se abriu nos últimos anos a realização de audiências e consultas públicas. A ouvidoria também avançou no diálogo com os programas próprios de rádio e TV. Mas é preciso ampliar a criação de espaços permanentes de diálogo democrático entre a empresa, seu Conselho Curador e ouvidoria, com toda a sociedade.
Tão importante quanto esse esforço para assegurar a autonomia no âmbito da gestão é dotar a empresa de fontes de financiamento robustas e estáveis. A 1a Conferência Nacional de Comunicação, que reuniu dezenas de milhares de pessoas para discutir as prioridades para a mídia no país, aprovou a criação de um fundo para as emissoras públicas, em especial para a EBC. Outro mecanismo, a Contribuição para o Fomento à Radiodifusão Pública, continua suspensa em meio a uma disputa judicial e não cumpriu o seu papel, até o presente momento, de ser uma fonte que pudesse equilibrar a dependência das verbas do Orçamento Geral da União. Neste sentido, o recente movimento de ampliação da busca de recursos próprios, embora seja importante para compor este quadro de fontes diversas, deve ser sempre observado de perto para não contaminar as opções editoriais em razão dos compromissos com os financiadores.
Certos de que nossas críticas são no sentido de contribuir para uma comunicação pública mais saudável, mais forte, mais plena e mais pública, e sob pena de a manutenção do status quo colocar em risco o projeto da comunicação pública que defendemos, oferecemos nossas contribuições à EBC e ao Conselho Curador da Empresa.
Brasília, 20 de março de 2013
Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social