Começou nesta quinta-feira (25/06) o julgamento das Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) 4679, 4747, 4756 e 4923, ajuizadas contra a Lei do Serviço de Acesso Condicionado (12.485/2011). Movidas pelo DEM e por associações comerciais como a Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), a Associação Brasileira de Radiodifusores (Abra) e a Associação Brasileira de Televisão por Assinatura em UHF (ABTVU), as ações questionam principalmente dois aspectos da lei, que em 2011 colocou em vigor um novo marco legislativo para todos os serviços de TV paga no País: o impedimento de que uma mesma empresa seja produtora e distribuidora de conteúdo, e a determinação de cotas de conteúdo nacional na programação dos canais.

O Intervozes participou do julgamento na figura de amicus curiae, defendendo a constitucionalidade da lei. Representando o coletivo, Bráulio Araújo afirmou que a Constituição Federal reconhece a competência do Estado para legislar em relação à economia e aos agentes econômicos, inclusive no caso das telecomunicações e da radiodifusão.

“A livre iniciativa e a livre concorrência não são normas absolutas”, destacou o advogado, para quem é necessário que o Estado busque atender os interesses públicos e os princípios constitucionais em sua ação. “O Estado tem sim poder para impor e estabelecer limites fixos à concentração de propriedade nos meios de comunicação”, disse. Esse é o único setor econômico em que a Constituição Federal proíbe expressamente o monopólio e o oligopólio “porque a Constituição reconhece que os meios de comunicação não são apenas bens econômicos, eles são espaços fundamentais para a democracia”, lembrou.

Para o Intervozes, o prejuízo à democracia causado pela concentração midiática é maior do que qualquer benefício econômico que essa situação poderia gerar, por isso o coletivo defende os mecanismos legais que proíbem a propriedade cruzada, como fazem as regras de países como Estados Unidos e Argentina.

Cotas para conteúdo nacional

A Lei 12.485 estabelece que, nos canais de espaço qualificado, devem ser garantidas, por semana, 3h30 de conteúdos brasileiros no horário nobre. Metade desse conteúdo deverá ser produzida por produtora brasileira independente. A medida também foi questioanda no STF pelas empresas de comunicação. “Mas é importante que a imagem do Brasil e a imagem da cultura brasileira sejam produzidas pelos próprios brasileiros, além dos produtores internacionais”, destacou Braulio de Araújo.

Segundo a Advocacia Geral da União (AGU), o número de canais que veiculam mais de 21h de programação nacional passou de 7, em 2010, para 22, em 2015, fruto da concretização fo que estabelece a lei. Já o número de séries produzidas e veiculadas também no país cresceu. Eram 73, em 2011, e no ano passado somaram 506 produções.

Vale destacar que o mecanismo das cotas vai ao encontro da própria Constituição Federal, que estabelece a necessidade dos meios de comunicação estimularem a programação regional e independente, como forma de garantir a diversidade dos meios de comunicação.

Voto histórico

Proferido neste primeiro dia do julgamento das ADIs, o relator, ministro Luiz Fux, não apenas invalidou as alegações de inconstitucionalidade apresentadas pelas empresas de mídia como proferiu um voto que mostra, de forma inequívoca, a validade e a necessidade da regulação da mídia para a garantia da liberdade de expressão, diversidade e pluralidade no sistema de comunicação do país.

O ministro reafirmou o papel do Estado para a concretização dos princípios estabelecidos na Constituição Federal e defendeu os principais mecanismos da lei questionados pelas associações comerciais: o impedimento de que uma mesma empresa seja produtora e distribuidora de conteúdo, e a determinação de cotas de conteúdo nacional na programação dos canais. Para Fux, “o mercado audiovisual – deixado por si próprio – é incapaz de promover a diversidade de conteúdo e o pluralismo que se espera dos meios de comunicação de massa”.

O ministro do STF foi categórico ao afirmar que a 12.485 contribui para a diversificação do conteúdo e “tende a evitar que o mercado de TV por assinatura se feche, ampliando as fontes de informação disponíveis e o espaço para a manifestação de novos entrantes”.

Ratificou, ainda, que a lei ora questionada atende à concretização não apenas do que dispõe a Constituição, mas também a Convenção sobre a Proteção e Promoção da Diversidade das Expressões Culturais, promulgada pela Unesco e ratificada pelo Brasil. O tratado internacional diz que “cada parte poderá adotar medidas destinadas a proteger e promover a diversidade das expressões culturais em seu território”. Entre as medidas, a convenção cita aquelas destinadas a “fornecer às indústrias culturais nacionais independentes e às atividades no setor informal acesso efetivo aos meios de produção, difusão e distribuição das atividades, bens e serviços culturais.”

O posicionamento de Fux, como ele mesmo afirmou, considerou o papel crucial da comunicação social e sua enorme capacidade de influenciar a opinião da população.

O julgamento das ações foi paralisado logo após a leitura do voto do relator. Além de Fux, nenhum ministro se manifestou sobre o caso, que deve voltar ao plenário do STF no segundo semestre.