Em carta enviada ao Ministério Público Federal, coletivo solicita que este reveja decisão do Ministério da Justiça de suspender efeitos da vinculação entre classificação dos programas e hora de exibição durante o horário de verão, conforme solicitado pela Abert

O Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social enviou nesta quinta-feira (16) carta ao Ministério Público Federal solicitando que este manifeste-se a favor da plena vigência da Portaria 1.220/2007, que institui a classificação indicativa para programas de televisão. A iniciativa foi motivada pela decisão do Ministério da Justiça de acatar solicitação da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e TV (Abert) para que a vinculação entre a classificação e o horário local fosse suspensa durante o período do horário de verão.

O MJ afirma que revisará sua posição caso o Ministério Público manifeste-se contrariamente à medida.

Veja a íntegra da carta enviada à Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão:

AO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

PROCURADORIA FEDERAL DOS DIREITOS DO CIDADÃO

A/C V. Exa. Sra. Gilda Pereira de Carvalho

São Paulo, 16 de outubro de 2008

Estimada Procuradora Federal dos Direitos do Cidadão, Gilda Pereira de Carvalho,

A decisão do Ministério da Justiça de suspender os efeitos da classificação indicativa por conta da vigência do horário de verão é insustentável e fere frontalmente a Portaria 1.220/2007. Essa portaria do próprio ministério estabelece claramente, em seu artigo 19, os termos da vinculação entre classificação e faixas horárias de exibição. Em parágrafo único do mesmo artigo, estabelece a observância dos diferentes fusos horários vigentes no Brasil, mostrando que a referência não é unicamente o horário de Brasília.Essa definição é absolutamente fiel ao espírito da legislação, ao não diferenciar crianças e adolescentes em função do seu estado de moradia.

Durante a vigência do horário de verão, Brasília, São Paulo e Rio de Janeiro, onde estão as cabeças-de-rede de todas as emissoras, adiantam o seu horário em uma hora. Se mantida a transmissão simultânea para regiões que têm hoje o mesmo fuso, isso significa que o Nordeste, por exemplo, vai receber a programação com uma hora de antecedência, o que gerará um desrespeito à portaria naqueles estados. Não há por que esse desrespeito ser autorizado, dado que:

1. A legislação das concessões de TV não estabelece outorgas nacionais. As emissoras têm outorgas por município, e portanto não têm por que serem tratadas como se fossem nacionalmente um grupo único. Além disso, por conta do limite legal de propriedade, a maioria das emissoras nem pertence ao mesmo grupo empresarial da cabeça-de-rede, e são ligadas simplesmente por contrato de afiliação. Apenas a título de exemplo, a única emissora própria das Organizações Globo que não está em área de vigência do horário de verão é a de Recife.

2. A alegação das empresas de que horário de verão não é subproduto do fuso horário não se sustenta nem científica nem juridicamente. Há inclusive jurisprudência do próprio STF mostrando essa relação.

3. Mesmo que essa argumentação se sustentasse, ela não poderia ser usada a favor do pedido das emissoras, por dois motivos. Primeiro porque a legislação é clara em relação aos horários. Se o horário de um município muda, ele continua tendo que ser respeitado. Afinal de contas, as crianças e adolescentes não mudam o seu horário de dormir nem o seu horário de escola por conta do horário de verão – é justamente por isso que se estabelece essa alteração durante quatro meses. O segundo motivo é que quem está mudando de horário são os municípios das geradoras cabeça-de-rede. O horário de toda a região Nordeste, por exemplo, não muda. Assim, independentemente da resposta do Ministério da Justiça sobre horário de verão ser ou não considerado fuso horário, o horário dos estados que não alteram o relógio permanece tendo que ser respeitado. Se, como as emissoras querem, o horário de verão não é considerado fuso horário, então elas teriam que transmitir a sua programação, nas regiões Sul e Sudeste, uma hora mais tarde. É justamente o inverso do que elas alegam.

Não bastassem todos esses argumentos, o motivo alegado pelas emissoras para solicitar a alteração é extremamente frágil. Eles apontam como principal motivo para não querer atender à classificação indicativa no período do horário de verão os altos custos estimados das afiliadas para gravar a programação e retransmitir no horário apropriado. A mesma argumentação foi usada até o ano passado para tentar justificar o desrespeito ao fuso horário da região Norte do Brasil. Contudo, desde o início do ano elas foram obrigadas a seguir esse fuso e não houve nenhum prejuízo insustentável para essas emissoras.

Já é esperado que as emissoras tentem adequar as regras do país a seus interesses. Inaceitável é o Ministério da Justiça acatar esse pedido, sem nenhuma sustentação legal para isso. Solicitamos, assim, que a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão do Ministério Público Federal atue no sentido de impedir esse desrespeito à Portaria 1.220/2007.

Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social