Presidente afirmou que pode mobilizar Forças Armadas para conter manifestações.

Mais de 30 organizações da sociedade civil, dentre estas o Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social, solicitam explicações ao presidente Jair Bolsonaro sobre o governo federal ter acionado na última quarta-feira (23) o Ministério da Defesa para monitorar possíveis protestos no Brasil, semelhantes aos que ocorrem no Chile. De acordo com reportagem veiculada no Estado de São Paulo, o presidente afirmou que pode mobilizar as Forças Armadas se for necessário.

As organizações protocolaram um pedido de esclarecimento ao Executivo por meio de ofício via Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão. De acordo com o documento, o teor da declaração do presidente é questionável uma vez que, a depender da maneira pela qual a determinação seja executada, pode-se configurar grave comprometimento de direitos fundamentais garantidos pela Constituição Federal.

“Compreendemos que o governo deve zelar pela manutenção da lei, porém não fica claro de que maneira esse monitoramento está sendo feito e há um potencial significativo de violação de direitos, cerceamento de liberdades de expressão e manifestação, além de violação de privacidade” comenta Ricardo Borges Martins, coordenador executivo do Pacto pela Democracia, coalizão de mais de 130 organizações da sociedade civil que atuam em defesa da democracia no Brasil.

Abaixo, o pedido de esclarecimento encaminhado à PFDC.

 

A Sua Excelência a Senhora
DEBORAH MACEDO DUPRAT DE BRITTO PEREIRA
Procuradora Federal dos Direitos do Cidadão
Setor de Administração Federal Sul
Brasília/DF

Ref.: Possível restrição a direitos fundamentais

Excelentíssima Senhora Procuradora,

Com surpresa e extrema preocupação, as entidades e iniciativas signatárias tomaram conhecimento de que o Exmo. Sr. Presidente da República teria solicitado ao Ministério da Defesa que monitore a possibilidade da ocorrência de protestos no país, a fim de que sejam acionadas as Forças Armadas para reprimi-los.

Conforme noticiado em diversos veículos de imprensa, o Presidente proferiu ontem (23/10), durante viagem à Ásia, as seguintes declarações públicas:

“Nós nos preparamos. Conversei com o ministro da Defesa sobre a possibilidade de ter movimentos como tivemos no passado, parecidos como o que está acontecendo no Chile. A gente se prepara para usar o artigo 142 da Constituição Federal, que é pela manutenção da lei e da ordem, caso eles venham a ser convocados por um dos três Poderes”.

O teor dessas declarações é profundamente inquietante, na medida em que – a depender do modo de execução das determinações presidenciais – pode-se configurar grave comprometimento de direitos fundamentais constitucionalmente protegidos.

Causa especial apreensão a possibilidade de violação das garantias expressas nos incisos IV, X e XVII do artigo 5º da Constituição Federal, que resguardam os direitos à intimidade, à vida privada e à imagem das pessoas, assim como as liberdades de reunião e de manifestação do pensamento.

Diante, portanto, do potencial gravoso para direitos fundamentais das medidas em possivelmente em curso, as entidades e iniciativas signatárias exortam esta Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão a adotar as medidas que considere mais adequadas para preservação das referidas garantias basilares de nosso Pacto Fundamental, sem prejuízo das que se orientem a solicitar dos órgãos e autoridades competentes informações sobre eventuais providências adotadas por determinação do Exmo. Sr. Presidente da República e que se relacionem com as declarações acima transcritas.

Ações governamentais de monitoramento e controle podem eventualmente ultrapassar os limites legais e comprometer aspectos relevantes da atuação de indivíduos e associações legitimamente constituídas. As organizações e iniciativas signatárias rogam, portanto, a esse órgão ministerial para que, na condição de fiscal da Lei, intervenha para afastar qualquer possibilidade de dano às referidas garantias constitucionais.

Certas do empenho de Vossa Excelência para dar concretude aos direitos e garantias fundamentais, as organizações e iniciativas signatárias apresentam sinceros protestos de elevada estima e consideração.

Respeitosamente,

1. 342 Artes
2. Artigo 19
3. Atados
4. Bancada Ativista
5. BrCidades
6. Casa Fluminense
7. Conectas Direitos Humanos
8. Congresso em Foco
9. DEFEMDE – Rede de Juristas Feministas
10. Delibera Brasil
11. Frente Favela Brasil
12. Fundação Avina
13. Gestos – Soropositividade, Comunicação e Gênero
14. Goianas na Urna
15. Imargem
16. INESC
17. Instituto de Defesa do Direito de Defesa – IDDD
18. Instituto de Desenvolvimento Social Baiano
19. Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social
20. Instituto Fernand Braudel de Economia Mundial
21. Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social
22. Mapa Educação
23. Movimento Acredito
24. Movimento Voto Consciente
25. Nossas
26. Pacto – Org. Regenerativas
27. Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema Político
28. Rede Justiça Criminal
29. TETO
30. Transparência Brasil
31. Transparência Capixaba
32. UneAfro Brasil