Período eleitoral expõe agressões à imprensa de apoiadores da extrema direita
Por comunicainter em
Com o avançar do período eleitoral e a sequência de debates, entrevistas e inserções dos candidatos nos meios de comunicação, têm se multiplicado também ataques aos jornalistas que protagonizam as mediações ou tecem análises sobre as candidaturas. O destaque desta semana são as agressões realizadas por apoiadores de Pablo Marçal (PRTB), candidato à Prefeitura de São Paulo.
Com o bloqueio do X no Brasil, as principais agressões na web têm sido feitas no Instagram, rede social que contabilizou, no último período da análise (5 a 11 de setembro), um total de 119 postagens com ataques a jornalistas e comunicadores. Muitas dessas agressões são produzidas após a participação de candidatos em debates, como é o caso do episódio de violência contra a jornalista Vera Magalhães, comentarista do Viva Voz, na Rádio CBN.
No dia 5 de setembro, ela comentava o resultado da pesquisa Datafolha que apresentava aumento de quatro pontos percentuais na rejeição de Pablo Marçal, em São Paulo, chegando a 38%. A informação motivou uma escalada de ataques contra a jornalista, colocando a profissional na segunda posição do ranking dos mais agredidos, com o total de 34 ofensas diretas. O post da CBN nesse dia chegou a mais de 4.000 curtidas e cerca de 1.500 comentários, muito mais do que a média do perfil da emissora no Instagram.
Outro jornalista que sofreu ataques diretos no último período analisado foi Leonardo Sakamoto, que produz diariamente análises políticas para o Portal UOL, com 6 ataques. Ao divulgar os resultados da pesquisa eleitoral dos candidatos à Prefeitura de São Paulo, acabou atraindo eleitores do candidato Pablo Marçal, que nos comentários da publicação afirmavam que o candidato do PRTB estava conquistando muitos eleitores apesar da mídia.
Enquanto os termos mais usados para ofender a jornalista Vera Magalhães e seu veículo foram “jornalistas militantes”, “infantil”, “imprensa podre e militante” e “comunista”, os usados para desqualificar o trabalho de Leonardo Sakamoto e da imprensa foram “mídia podre”, “jornalismo tendencioso”, “extrema imprensa” e “imprensa militante”. Os comentários eram seguidos por expressões de apoio ao candidato Pablo Marçal.
Além de Vera Magalhães e Leonardo Sakamoto, outros jornalistas bastante atacados no Instagram foram Lauro Jardim (5), Andreia Sadi (4), Octavio Guedes (4), entre outros. Já os veículos com maior número de ataques foram Rede Globo (60 ataques) e Rádio CBN (34).
A ofensiva dos apoiadores de candidatos de extrema direita sobre a grande mídia é fenômeno relativamente novo, que tem se intensificado na última década. Vem sempre acompanhado de uma postura anti-imprensa e antidemocrática exercida pelos próprios candidatos (ou mandatários) que representam esse segmento político. Um dos casos recentes é o ataque de Pablo Marçal ao jornalista Josias de Souza, durante debate realizado pela TV Gazeta.
Embora com volume muito menor no último período analisado, em função do bloqueio ordenado pelo ministro Alexandre de Moraes, também foi possível mapear agressões contra jornalistas e comunicadores na plataforma X, onde foram encontrados 39 posts ofensivos/ataques a jornalistas e meios de comunicação. Diferente do Instagram, o mapeamento nessa rede se deu entre os dias 1º e 11 de setembro.
No X, os ataques foram maiores às empresas do que aos jornalistas. Os perfis mais atacados diretamente na plataforma nos onze dias de campanha foram: Rede Globo (6 ataques), Folha de S.Paulo (3), UOL (2) e Fernão Mesquita (2) e Paulo Figueiredo (1). É possível que essas postagens tenham sido realizadas por usuários que continuaram postando no X utilizando VPNs, acessando de regiões onde o bloqueio não foi efetivo ou postando de fora do país. As hashtags mais utilizadas foram #globolixo (58 menções) e #midiapodre (34). Outros termos para desqualificar jornalistas e imprensa foram: militante(s), vergonha e podre.
O resultado dessa coleta mostra que o bloqueio do X foi decisivo na diminuição dos ataques a jornalistas durante o período monitorado, o que comprova que a rede vinha se tornando um ambiente digital particularmente hostil à prática jornalística e à liberdade de imprensa. E, assim como visto no Instagram, grande parte dos ataques no período de análise foram proferidos por apoiadores e candidaturas ligadas à extrema direita no Brasil.
Abaixo, alguns exemplos das postagens com ataques no X:
@fernaolmesquita Não apoio e não voto em Marçal meu norte é Bolsonaro. Mas Intercept é jornalismo CANALHA de militância sem caráter. Foram até lá e não entrevistaram NINGUÉM? Não perguntaram a ninguém sobre o projeto ou sobre Marçal? Não mostraram nenhuma das casas construídas p dentro ou fora?
@FIGHTZINCLUB Jornalista Brasileiro tem tudo que ser tirado pra merda como marçal faz não tem como respeitar essa corja
Abaixo, alguns exemplos de comentários com ataques postados no Instagram:
A rejeição não existe. Esse comentário é palpite pessoal. Hoje é assim, jornalista dá opinião própria e não notícia. Modo operante de esquerda. Divulgação de conteúdo mentiroso para que vire verdade fake.
Vc é muito infantil prá ser jornalista e logo fazer perguntas pro Pablo Marçal, vc passou vergonha cara é inteligente enquanto vc é meia comunista só levou taca
Ataques fora das redes
Fora das redes sociais, jornalistas seguem sendo alvos de ataques, discursos hostis e, inclusive, agressões físicas.
Embora fora do período de monitoramento deste boletim, a equipe da Coalizão teve acesso nesta semana a um caso ocorrido no dia 04 de setembro, em Guarabira, no estado da Paraíba. A candidata à prefeita Léa Toscano (União Brasil) se recusou a participar de um debate eleitoral municipal promovido pela TV Mídia. Ela se opunha à mediação feita pela jornalista Michele Marques, com um discurso contra a credibilidade da jornalista, acusando-a de ser parcial. A jornalista e o veículo explicaram que desde 2012 realizam esse trabalho de maneira profissional e nunca tinham sido questionados dessa maneira. Por caracterizar um discurso estigmatizante de uma candidata contra a imprensa, o caso foi registrado pelo monitoramento da Coalizão.
No dia 9 de setembro, uma equipe da TV Norte Amazonas – SBT Manaus, composta pelo repórter Gabriel de Abreu Lima e pelo repórter cinematográfico Alan Glesseir, foi hostilizada e ameaçada durante comício da candidata à reeleição, Patrícia Lopes, no município de Presidente Figueiredo (AM). A agressão foi protagonizada por seguranças da prefeita no momento em que foi questionada sobre os contratos sem licitação na gestão municipal.
Sobre o projeto
Este é o terceiro relatório de monitoramento de ataques on-line contra a imprensa nas Eleições de 2024, que cobre a quarta semana de campanha eleitoral (5 a 11 de setembro). O projeto está sendo realizado em parceria com o Labic/UFES. A Coalizão em Defesa do Jornalismo está monitorando, desde o dia 15 de agosto, contas de jornalistas, meios de comunicação em 9 capitais do Brasil (Porto Velho/RO, Belém/PA, Fortaleza/CE, Maceió/AL, Cuiabá/MT, Rio de Janeiro/RJ, São Paulo/SP, Florianópolis/SC e Porto Alegre/RS) e de candidatos/as em todas as capitais, nas plataformas de redes sociais Instagram e X.
São registradas postagens com termos e hashtags ofensivas e estigmatizantes contra o trabalho da imprensa no âmbito da cobertura eleitoral. Episódios de ataques e violações ao trabalho da imprensa fora das redes também estão sendo acompanhados. A análise dos principais resultados do levantamento será publicada toda semana, até a realização do segundo turno. Ao final das eleições, um relatório consolidará a avaliação do período monitorado e trará recomendações às autoridades e plataformas digitais.
Integram a Coalizão em Defesa do Jornalismo: Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo), Ajor (Associação de Jornalismo Digital), Artigo 19, CPJ (Comitê para a Proteção de Jornalistas), Fenaj (Federação Nacional de Jornalistas), Instituto Palavra Aberta, Instituto Vladimir Herzog, Instituto Tornavoz, Intervozes, Jeduca (Associação de Jornalistas de Educação) e RSF (Repórteres Sem Fronteiras).