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O Intervozes e a organização Internet sem Fronteiras promoveram neste dia 30 de março um debate sobre o projeto de construção de um cabo submarino entre o Brasil e a Europa, apelidado de Ellalink. A discussão ocorreu durante o evento Rightscon, em Bruxelas, um dos maiores do mundo voltado à temática dos direitos digitais.

O cabo foi anunciado há cerca de três anos mas a sua construção ainda não foi iniciada. A obra será uma parceria entre a empresa estatal Telebrás e a companhia espahola Islalink. A promessa do consórcio é que o cabo permita o tráfego de até 30 terabites por segundo. Segundo o acordo, 10% da capacidade deve ser usada para serviços vinculados a universidades e a centros de pesquisa científica.

Hoje o tráfego de dados do Brasil para a Europa tem que passar pelos Estados Unidos. Isso faz com que o custo desse transporte seja caro. A expectativa, pelo menos advogada pelos promotores do projeto, é que a existência de um novo cabo possa reduzir esse custo ao permitir a ligação direta entre o país e o continente.

Para Loretta Anania, do Núcleo de Internet da Nova Geração da Comissão Europeia, o acesso em banda larga tem um potencial importante de promoção do desenvolvimento e para que isso se realize de forma ampla é importante diminuir as diferenças entre países e regiões mais ricas e de menor renda. “Nessa época de big data, você precisa ter capacidade de dados. E precisa reduzir a desigualdade de acesso e da capacidade”.

Felix Blanc, da ONG Internet sem Fronteiras, destacou a relevância de discutir, dentro de todas as redes de acesso e transporte, os cabos submarinos. “A questão do cabo submarino é importante pois pode contribuir para reduzir o custo da oferta de banda larga no país e também envolve questões de privacidade, já que por essa estrutura trafega 98% dos dados usados na Internet”, explicou. Felix  também defende a possibilidade da infraestrutura dos cabos ser considerada um bens comum, assim como o ar ou a água.

Uma das preocupações manifestadas durante o debate foi de que maneira esse cabo será gerido e como a sua existência, e o investimento público envolvido no projeto, irá se traduzir de fato em benefícios para os/as usuários/as. “Já tivemos experiências no Brasil, como o regime especial de desoneração do Plano Nacional de Banda Larga, nas quais empresas se beneficiaram de redução de custos mas isso não se traduziu em benefícios concretos. Então é preciso que haja obrigações e uma política efetiva por parte do Poder Público para que isso não seja apenas uma forma de aumentar a margem de lucro das empresas”, ponderou Jonas Valente, integrante do Intervozes.

Laura Tresca, da ONG Artigo 19, colocou preocupações quanto a mudanças no projeto após a derrubada da presidenta Dilma Rousseff em 2016. “A primeira motivação era evitar vigilância pelos EUA no contexto das denúncias de Edward Snowden. Mas agora, depois da mudança no governo, não está claro o que será feito do uso do cabo”, ressaltou. A representante citou o exemplo do satélite geoestacionário que será lançado nas próximas semanas. Ele foi construído com dinheiro público para gerar autonomia tecnológica e de transporte de dados para o Brasil mas 80% de sua capacidade será terceirizada para companhias internacionais.

Outra preocupação que apareceu no debate foi como o tráfego de dados pelo cabo irá aproveitar os Pontos de Troca de Tráfego (PTTs) implantados pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI BR), locais que interconectam diversas redes e outras infraestruturas de agentes públicos e privados, para potencializar a redução de custos e o acesso à Rede.

Para a representante do escritório brasileiro da ONG Internet sem Fronteiras Florence Poznanski, o painel foi importante para colher contribuições. O próximo passo é avançar na pesquisa sobre o projeto do cabo e sua implantação buscando problematizar a transparência e a participação da sociedade civil na governança do consórcio e organizar a sociedade em defesa da conectividade.