​Nas últimas semanas, em diferentes cidades ​- sede da Copa do Mundo, multiplicaram-se os casos de violência contra manifestantes e comunicadores presentes – seja protestando, seja fazendo a cobertura – em protestos críticos à realização do Mundial no Brasil. No Rio de Janeiro, em especial, eles foram intencionalmente atingidos, agredidos e tiveram seus equipamentos de trabalho destruídos ou confiscados, numa clara tentativa das forças armadas de impedir a cobertura das ações violentas que ocorreram.

Mais alarmante do que isso, foi a expedição, na véspera da final da Copa, de 26 mandados de prisão temporária contra ativistas, professores, jornalistas, radialistas e midiativistas, acusados de associação criminosa sob justificativa de possível risco de crime futuro nos atos marcados para o dia do encerramento do Mundial. Apesar de decisões favoráveis no sentido de soltar os manifestantes presos, o Ministério Público ofereceu denúncia contra 23 destes manifestantes, tendo o juiz decretado a prisão temporária de todos no último dia 18. Tamanha repressão constitui uma ameaça gravíssima à liberdade de expressão e à livre manifestação, ambos direitos humanos garantidos pela Constituição brasileira e respaldados por tratados internacionais de direitos humanos ratificados pelo nosso país.

Somente durante a realização da Copa no Brasil, estima-se que mais de 200 pessoas foram detidas e aproximadamente 75 ficaram feridas no contexto de protestos. Além disso, desde os protestos que antecederam a Copa, pelo menos dez mortes foram causadas pelo contexto de confusão e agressões criado em resposta às manifestações. Muitos entre esses eram jornalistas, comunicadores / profissionais da mídia e midiativistas.

Há cerca de um ano, a questão da violência contra comunicadores no Brasil vem sendo seriamente debatida por entidades sindicais e organizações da sociedade civil que atuam em defesa da liberdade de expressão no âmbito de um grupo de trabalho criado sob os auspícios do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CDDPH). O grupo encerrou sua atuação formal em março deste ano, propondo uma série de recomendações ao Estado para a prevenção da violência e proteção de comunicadores. Cobrou-se, entre outras ações, a responsabilização efetiva e célere dos que praticam esses crimes, com o combate à impunidade.

Sobre a violência contra comunicadores nos protestos, o grupo de trabalho articulou uma audiência pública em junho passado, em São Paulo, para que os profissionais denunciassem agressões e outras violações que sofreram durante manifestações na capital paulista. Como resultado da audiência, entre outras ações, sugeriu-se a adoção de códigos de conduta para atuação policial no acompanhamento de manifestações, ressaltando-se o papel dos comunicadores nesse contexto.

Considerando a continuidade das agressões a comunicadores e ativistas e o cerceamento à sua liberdade de expressão e manifestação, à revelia dos padrões de respeito aos direitos humanos, é imperativo que as autoridades públicas se posicionem sobre a desproporcionalidade da ação das forças de segurança e sobre a grave tentativa de impedir a livre circulação de informações por meio da cobertura de manifestações públicas.

Em razão disso, as organizações abaixo-assinadas, que participaram do grupo de trabalho de segurança de comunicadores do CDDPH, vem cobrar um posicionamento público da Secretaria Nacional de Direitos Humanos, do Ministério da Justiça e dos órgãos responsáveis pelas forças de segurança no sentido de interromper tais práticas e de garantir a punição dos responsáveis pelas sucessivas supressões de direitos no país.

As violações aos direitos humanos ocorridas desde os protestos de junho de 2013, e especialmente na​s últimas semana​s, não foram atos isolados. Elas representam uma política de repressão a manifestações públicas e uma violação ao direito de toda a sociedade brasileira de receber informações sobre os protestos. A Organização dos Estados Americanos acaba de lançar um relatório sobre a liberdade de expressão nas Américas, elaborado por sua Relatoria Especial para Liberdade de Expressão, no qual justamente recomenda aos Estados que instruam suas forças de segurança sobre a importância do respeito ao direito de manifestação e ao trabalho jornalístico em protestos.

​​Esperamos assim um rápido posicionamento das autoridades sobre as violações ocorridas no último período – que seguem em curso com a manutenção das prisões preventivas –, assim como nos solidarizamos com todos os comunicadores e manifestantes agredidos durante a Copa.

​Assinam a carta:

​​ARTIGO 19

Comissão de Defesa da Liberdade de Imprensa e Direitos Humanos da ABI

FITERT – Federação Interestadual dos Trabalhadores em Empresas de Radiodifusão e Televisão

Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social

MNRC – Movimento Nacional de Rádios Comunitárias​