Terceira edição da série Vozes Silenciadas foi lançada na quinta (12), com debate online

A Reforma da Previdência é uma das agendas centrais do novo governo Bolsonaro e tem tido ampla cobertura na mídia tradicional. Mas como o tema vem sendo abordado? Como os principais grupos de comunicação do Brasil se posicionaram diante da proposta do Executivo? Com o objetivo de investigar essas questões, o Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social lançou, na quinta-feira (12), o estudo Vozes Silenciadas: Reforma da Previdência e Mídia. No mesmo dia, às 19h, uma conversa online apresentou e discutiu os dados da pesquisa com a participação de Maria Martha, editora da Gênero e Número; João Feres, coordenador do Manchetômetro; e Rodolfo Vianna, autor da pesquisa e integrante do Intervozes.

O estudo analisou as edições impressas dos jornais Folha de S.Paulo, O Estado de S.Paulo e O Globo publicadas de 1º de janeiro a 30 de junho deste ano. Entre os especialistas ouvidos nas reportagens, 64% posicionaram-se favoravelmente à reforma da Previdência; 8,5% foram parcialmente contrários (mesmo índice de posicionamentos não identificados) e 19% eram expressamente contra a proposta. Os principais argumentos utilizados por aqueles que não apoiavam a reforma foram a insatisfação com aspectos jurídicos específicos e a ausência dos militares no projeto.

Na cobertura televisiva, foram analisadas quatro semanas de edições dos telejornais Jornal Nacional (Rede Globo), Jornal da Record (Rede Record) e SBT Brasil (SBT). As análises foram feitas nos dias subsequentes a fatos importantes da tramitação da PEC 06/2019, começando por sua apresentação no Congresso Nacional no dia 20 de fevereiro. Portanto, a primeira semana de cobertura investigada foi entre os dias 20 a 27 de fevereiro. Em seguida, foi analisada a última semana de abril, logo após a aprovação do Relatório pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados. A terceira semana examinada foi entre os dias 4 e 11 de julho, logo após a aprovação do relatório sobre a reforma pela Comissão Especial da Câmara dos Deputados. A quarta e última semana foi a subsequente à aprovação da PEC 06/2019 pelo Plenário da Câmara dos Deputados em primeiro turno, entre os dias 12 a 19 de julho.

De acordo com o levantamento do Intervozes, poucos especialistas foram ouvidos nos telejornais. As edições estiveram focadas na explicação dos pontos do projeto e concederam grande espaço para as declarações de representantes do Ministério da Fazenda, com raros contrapontos à posição do governo. Dentre os(as) especialistas ouvidos nestes telejornais, 90% se manifestaram favoravelmente à reforma, enquanto 10% posicionaram-se contrariamente.

“Quando você mobiliza tantos especialistas com um mesmo tipo de posicionamento, você fabrica um falso consenso. Também é interessante perceber que em dado momento a mídia tradicional apaga a informação de que é um projeto de lei específico de reforma, que acaba transformado em “a” reforma da Previdência”, destacou Rodolfo Vianna.

Outro dado importante destacado pela pesquisa foi a disparidade de gênero entre os especialistas. Nos jornais impressos, 88% dos especialistas ouvidos são do gênero masculino, enquanto nos telejornais a participação dos homens foi de 89%. “Em relação ao recorte de gênero, não é uma surpresa, mas é um dado impactante e por um lado é bom a gente se sentir afetada por esse dado. Sabia que esse número seria significativo, mas confesso que 88% é muito triste. Uma coisa que chama a atenção é que muitas das vozes masculinas se repetem nos veículos de comunicação. É uma saída mais fácil para as redações, conveniente, e que deixa um espectro amplo de mulheres especialistas fora dessa discussão”, afirmou Maria Martha.

Esse dado se agrava quando se leva em conta que as mulheres são as mais afetadas com as mudanças propostas pela reforma da Previdência, atualmente em discussão no Senado Federal. Mulheres ganham menos que homens, são a maioria dos desempregados, trabalham mais e sem carteira assinada. Segundo o relatório do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) de 2019, a desigualdade de gênero no mercado de trabalho deve ser aprofundada com a reforma da Previdência de Bolsonaro.

Para João Feres, o obscurantismo prevaleceu. “A reforma da Previdência é uma reforma que vai afetar todos os brasileiros, com impacto social imenso. Uma quantidade enorme de vozes precisaria ser ouvida para uma cobertura minimamente justa e decente e estamos longe disso. O que ouvimos é uma cantilena. Eu não vi um artigo em jornal ou esquema em telejornal mostrando quem iria ganhar, o que iria ganhar, quem iria perder e o que iria perder. O obscurantismo em relação à informação é impressionante, é só opinião”.

Vozes Silenciadas

O estudo Vozes Silenciadas Reforma da Previdência e Mídia: o posicionamento de especialistas sobre a proposta de reforma da Previdência do governo Bolsonaro é a terceira edição da série Vozes Silenciadas, cujo objetivo é analisar a cobertura e o enquadramento de um tema na mídia. As pesquisas anteriores trataram da cobertura sobre o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), no período de realização de uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito que teve o movimento como alvo, em 2010, e das chamadas jornadas de junho de 2013. As pesquisas estão disponíveis para download gratuito neste link.

No dia 16 de setembro, foi realizado o evento de lançamento da pesquisa em Brasília, no Distrito Federal. Organizado em parceria com a CUT Brasília, o Comitê Lula Livre e as Frentes Brasil Popular e Povo sem Medo, o debate contou com a participação de dirigentes sindicais, militantes pelo direito à comunicação, integrantes de movimentos sociais e estudantes. A cobertura foi publicada no site da CUT.

Assista ao debate na íntegra: